quarta-feira, 29 de abril de 2009

Lagares de Vinho e de Azeite

Vista panorâmica sobre o lugar de Chãos

Na minha última crónica, referi-me às principais actividades produtivas a que a população Ferreirense se entrega, expondo alguns dos engenhos de irrigação e de moagem existentes no concelho. Retomando o tema da vida comunitária, analisarei, por ora, a importância dos Lagares de Vinho e de Azeite numa região de tão forte pendor rural. De facto, a exploração vinícola e olivícola possui ainda grande representatividade no Concelho de Ferreira do Zêzere. As vinhas e olivais concentram-se em torno dos núcleos habitacionais onde, a par das hortas, pomares e milheirais, ocupam os terrenos mais férteis.
Por essa razão, os lagares de vinho e de azeite sempre foram muito numerosos no Concelho de Ferreira do Zêzere, apresentando-se como duas das mais importantes fontes de sustento familiar e comunitário. O Lagar de Vinho surge como um equipamento anexo à casa de habitação, o que indica que a produção se destina quase exclusivamente ao consumo familiar. Funcionando na maioria das vezes como adega, a casa reservada ao lagar possui dimensões modestas e é dotada de poucas aberturas para o exterior, garantindo-se assim o isolamento necessário à boa conservação do vinho. Elemento imprescindível é o tanque de esmagamento da uva, onde o fruto, calcado a pé nu, é convertido em mosto, posteriormente reservado em cubas, dornas, potes ou barris.
Os mais antigos lagares de vinho existentes no concelho, inserem-se no contexto habitacional das grandes herdades regionais, como é o caso da Quinta das Valadas, na Freguesia de Areias, em que o Lagar e a Adega se assumem como duas construções distintas. Contrariamente ao fabrico do vinho, a obtenção de um bom azeite implicava destreza técnica e larga experiência no ofício, pelo que eram raras as unidades de exploração familiar. Geralmente existia um Lagar de Azeite por povoação, de carácter comunitário, ao qual os habitantes locais se deslocavam para moer a sua azeitona.
Até à segunda metade do século XX, predominaram na região de Ferreira do Zêzere os tradicionais Lagares de Varas, sendo comuns as unidades que dispunham de dois ou mais engenhos. O processo de obtenção do azeite era complexo e iniciava-se com o esmagamento da azeitona num moinho de galgas, o qual podia levar de uma a quatro mós verticais, geralmente accionadas pela força da água. A pasta assim obtida era disposta nas seiras, posteriormente empilhadas sob a vara, iniciando-se a prensagem através do aperto do fuso. As ceras eram então caldeadas com água aquecida no forno do lagar, o que ajudava o azeite a escapar do aperto. Por fim, a água ruça escorria para dentro de uma sucessão de depósitos denominados tarefas, sendo a última tarefa a mais delicada, pois consistia em escoar a água do fundo do reservatório de forma a evitar o menor desperdício de azeite possível.
Dos mais antigos lagares de varas existentes no concelho, a maioria foi industrializada – lagares do Escoural e do Rego da Murta [Freguesia de Areias] –, encontrando-se hoje abandonados e, em parte, arruinados – lagares do Açude da Laranjeira, da Quebrada do Meio [Freguesia de Chãos] e do Castelo de Paio Mendes [Freguesia de Paio Mendes]. Apenas o lagar de azeite de São Guilherme [Freguesia de Dornes] foi recuperado e adoptado a novas funcionalidades.
Vejamos em pormenor estes exemplos:
Lagar do Escoural: Junto da margem esquerda da ribeira de Ceras, ergue-se uma construção de grandes dimensões, que no passado serviu como lagar de azeite. Não obstante, e apesar de a estrutura preservar ainda, no seu interior, alguns dos engenhos industrializados empregues no esmagamento da azeitona e obtenção oleica, a actividade foi abandonada nesta unidade, que desta forma se vai lentamente degradando.
Lagar do Rego da Murta: Este antigo lagar de azeite localiza-se junto da margem esquerda da ribeira de São Domingos. Durante muitos anos, a estrutura preservou no seu interior as grandes varas de carvalho empregues no aperto das ceras. Mais recentemente, a produção foi mecanizada e industrializada, e as varas de madeira deram assim lugar a prensas metálicas. Porém, actualmente, também a produção de azeite foi abandonada nesta unidade.
Lagar do Açude da Laranjeira: Junto do açude da Ribeira dos Chãos, existe uma grande construção que hoje se encontra totalmente arruinada, mas que em tempos terá servido de lagar de azeite. De facto, num dos seus muros interiores, conservam-se ainda duas das cavidades onde entravam as varas de aperto do lagar. O imóvel, erigido em aparelho de pedra calcária e barro, era caracteristicamente dotado de poucas aberturas, possuindo cobertura em telhado de duas águas, constituídas por telha vã assente directamente sobre o ripado. Numa das extremidades da construção, existia ainda um moinho de galgas, onde a azeitona era macerada e transformada em pasta.
 
Lagar da Quebrada do Meio: Na aldeia da Quebrada do Meio existe uma construção arruinada, sobradada, que em tempos terá acolhido um lagar de azeite. O interior, bastante destruído, conserva ainda o grande fuso onde entrava a vara de aperto e que, na extremidade oposta, se ligava à parede do lagar. É igualmente visível o decantador que distribuía o líquido pelos vários depósitos e, aqui e além, sobrevivem vestígios de barris e tonéis arruinados.
Lagar do Castelo de Paio Mendes: No lugar do Castelo de Paio Mendes ergue-se um imponente edifício que, em tempos idos, funcionou como lagar de azeite, mas que hoje se encontra abandonado. Apesar de não ter sido possível visitar o interior do imóvel, e de acordo com os relatos orais recolhidos no local, o lagar do Castelo de Paio Mendes tratava-se de uma importante unidade de produção, sendo o azeite aí obtido distribuído por todo o concelho de Ferreira do Zêzere. De facto, junto dos muros exteriores da construção, ainda se preserva um grande número de galgas, factor indicativo da quantidade de engenhos que aí devem ter laborado.
 
Lagar de São Guilherme: Junto da ribeira de São Guilherme existe um antigo lagar de azeite, recentemente reconstruído com o apoio da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere, onde chegaram a decorrer alguns eventos culturais. Da primitiva construção manteve-se a sua estrutura geral, de planta longitudinal, dotada de poucas aberturas e telhado em cobertura de duas águas que, pelo lado da entrada principal, descem sobre um pequeno alpendre assente sobre colunas. Conservam-se ainda algumas galgas, assim como o paredão onde encaixava a roda de copos que, ao girar, fazia mover o moinho onde era macerada a azeitona.

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